Sobre "A Inocência do Padre Brown"
Personagem originalíssimo de Chesterton, surgido primeiramente no conto A Cruz Azul, o saudoso padre Brown não perde sua originalidade e a sua veia clássica, uma vez que os temas não oxidam com o tempo e parecem estar na ordem do dia.
Para os mais aficionados progressistas de plantão, a trama dos contos de Brown pode soar como melodramas ao gosto de um período medieval, como alguns poderiam ousar dizer, próprios de uma época envolta em trevas fundamentalistas e anti racionais. A grande questão é o fato de que a personagem é exatamente o contrário. Em certa feita, Chesterton escreveu a ilustre frase:
Chegará o dia em que teremos de provar ao mundo que a grama é verde
Parece-me que padre Brown procura provar o tempo todo que a cor da grama é verde, ainda que aqueles mesmos críticos de plantão supracitados possam afirmar que a religião obscurece a razão, o que Brown oferece nos contos é exatamente o contrário e o faz com maestria e um método próprio: o método indutivo.
Antes de continuarmos a esclarecer algumas questões acerca do método do padre, vale a pena fazer uma digressão e citarmos o detetive Sherlock Holmes de Doyle. No livro Um estudo em Vermelho há um capítulo intitulado A Ciência da Dedução no qual o leitor é apresentado às ideias do detetive sobre o modo como é possível descobrir praticamente qualquer coisa a partir da dedução. No trecho a seguir podemos seguir esse raciocínio:
Toda a vida é portanto uma grande corrente, cuja natureza é conhecida sempre que vislumbramos um único de seus elos. Como todas as outras artes, a Ciência da Dedução e Análise é tal que só pode ser adquirida mediante longo e paciente estudo, e a vida não é longa o bastante para permitir a um mortal atingir nela a máxima perfeição possível
Enquanto o grande detetive partia do geral para o particular seguindo o método dedutivo e com isso atingia os seus objetivos, padre Brown também o fazia, porém por meio do método indutivo. Contudo, a resolução dos casos se dá de maneira muito particular com o padre simplesmente pelo fato de que ele não é um detetive por natureza e o seu fim último não é solucionar crimes, mas salvar almas, de modo que ele conclui o primeiro sem deixar de realizar ou ao menos tentar realizar o último.
No primeiro conto que abre o livro "A Inocência de Padre Brown", o antagonista exclama estupefato:
"_Mas como diabos o senhor conhece tantos horrores?" [...]
(Padre Brown responde)
_ Nunca lhe tinha ocorrido que um homem que quase não faz mais do que escutar os verdadeiros pecados dos homens, não poderia ser totalmente desconhecedor da maldade humana?"
A beleza dos contos por traz do personagem padre encanta pela nobreza com que as tramas se desenrolam em um fio de complexidade humana que parece encontrar nos dias de hoje uma espécie de fio de Ariadne que nos guia pelo labirinto difuso do pós-modernismo e nos prova que a grama é de fato verde.
Aristóteles criou o conceito de verossimilhança que é basicamente a coesão e a unidade entre as partes da narrativa. Em histórias de detetive esse conceito deve encontrar a justeza própria para convencer o leitor de que vale a pena continuar a ler a história e ao fim e ao cabo convencer-se de que o desenrolar dos fatos é estética, lógica e coerentemente válida. Os contos de padre Brown atingem esse critério com louvor.
Para os interessados em histórias de detetives, indico o box com as obras completas de Padre Brown da editora Sociedade Chesterton Brasil e também o box com as obras completas de Sherlock Holmes da editora Harper Collins.
Professor Luciano Aparecido Marques
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